O sertanejo do Semiárido e o sertanejo de outras regiões

Faz­er um para­le­lo entre o ser­tane­jo do Semi­ári­do Brasileiro e o ser­tane­jo das regiões mais chu­vosas. Pron­to, está aí a difer­ença, no Semi­ári­do chove em média ape­nas 402 mm por ano e isso num cur­to espaço de tem­po, isto é, em no máx­i­mo três meses do ano, enquan­to que nas regiões do Sul e Sud­este chove mais e de for­ma mais dis­tribuí­da durante o ano, poden­do o ser­tane­jo dessas regiões plan­tar, col­her para o seu sus­ten­to e ain­da vender o que sobra. O Ser­tane­jo do Semi­ári­do após a labu­ta do dia, ao chegar em casa a pobre esposa, que tam­bém lab­utou na roça per­gun­ta, “mari­do, vai me usar hoje”, ele responde,” não”, aí ela diz,” então vou lavar só os pés”. É isso mes­mo, tem que se econ­o­mizar a pou­ca água de que dis­põe. Mas tem como se ter água durante todo o ano, inclu­sive para plantar.

Se o ser­tane­jo do Semi­ári­do tiv­er água durante mais meses durante o ano, não ape­nas para o con­sumo humano e ani­mal, mas tam­bém para pro­duzir, ele deixará de ser um estor­vo para os gov­er­nos, não pre­cis­ará de água de car­ro-pipa. É bem ver­dade que os Pro­je­tos de Irri­gação são de fun­da­men­tal importân­cia para a econo­mia da região, dis­so sou teste­munha, pois par­tic­i­pamos da implan­tação de três dess­es grandes pro­je­tos e par­tic­i­pamos da manutenção de out­ros tan­tos. Vemos ali, sem som­bras de dúvi­das, o pro­gres­so e a pujança da econo­mia, mas vemos tam­bém a desigual­dade de class­es, pois os pro­je­tos de irri­gação tem atraí­do, e isso é bom, o inter­esse de pes­soas de nív­el de esco­lar­i­dade de até 3º Grau, empresários dos qua­tro can­tos do País e até do exte­ri­or, por con­ta da pros­peri­dade que se pode ter nos Perímet­ros Irri­ga­dos. Temos vis­to tam­bém, se bem que em menor número, pes­soas nati­vas, agricul­tor rur­al nati­vo, alcançar o sta­tus de empresário da agri­cul­tura irrigada.

Só que a grande maio­r­ia do ser­tane­jo nordes­ti­no está fora dos Perímet­ros Irri­ga­dos e não há como alcançá-los com ess­es pro­je­tos, seja por questão de cus­tos, seja por questão de logís­ti­ca. É essa grande maio­r­ia que sofre com os perío­dos de esti­a­gens, não ten­do água nem para o con­sumo humano e nem ani­mal. É essa grande maio­r­ia que até os dias de hoje, é um estor­vo para os gov­er­nos, mas não são e nem podem ser alcançadas pelos grandes pro­je­tos de irri­gação, mas se essa grande maio­r­ia tiv­er uma deter­mi­na­da quan­ti­dade de água, ela pode deixar de ser um estorvo.

Ain­da está em exe­cução a Trans­posição das águas do São Fran­cis­co, mas não é solução, a propósi­to, se parar por aí o gov­er­no vai econ­o­mizar, pois os canais da trans­posição serão aban­don­a­dos tão logo os gov­er­nos deix­em de pagar a con­ta de ener­gia, eu já vi esse filme por no mín­i­mo três vezes. Mas ess­es canais poderão ser aproveita­dos por cada gov­er­no local, isto é, por onde ess­es canais pas­sarem, em regiões de bacias sed­i­menta­res, podem ser feitos Poços Arte­sianos, com água de boa qual­i­dade e quan­ti­dade, e jog­a­rem ness­es canais, água bem mais bara­ta e limpa do que do Rio São Francisco.

Dessalin­iza­ção das águas do mar nem pen­sar, mes­mo porque as regiões que mais pre­cisam de água, estão longe do litoral. Com efeito, a Mãe Natureza já faz a dessalin­iza­ção das águas do mar gra­tuita­mente através da evap­o­ração, e mais, ain­da trans­porta gra­tuita­mente essas águas através das nuvens e despe­jam essas águas na Região, o prob­le­ma está em não se aproveitar essas águas e elas voltam para mar, ou pela super­fí­cie através dos cór­re­gos e ria­chos, ou por infiltrações.

Dessalin­iza­ção pode ser uma solução iso­la­da onde não exista a pos­si­bil­i­dade de uma out­ra solução, isto é, dessalin­iza­ção de um Poço Tubu­lar em uma pro­priedade rur­al, mes­mo assim não se tem solução para os rejeitos. No Semi­ári­do Brasileiro só chove de 600 a 900 mm e num perío­do um pouco maior a cada qua­tro anos e meio, é mui­ta água, cer­ca de 600 bil­hões de met­ros cúbi­cos. Como o perío­do chu­voso é maior, o inver­no é bom, as safras são boas e o ser­tane­jo ri atoa porque sua autoes­ti­ma e dig­nidade está ren­o­va­da, ness­es inver­nos mais pro­lon­ga­dos ele não é um estor­vo, ele pro­duz fei­jão de cor­da, bata­ta doce, cana de açú­car, mil­ho, melan­cia, abób­o­ra, beterra­ba, etc., tudo para o seu con­sumo e ain­da sobrar para vender.

Os ani­mais aumen­tam e com isso ele sus­ten­ta sua família durante todo ano, mas aí vem o ano seguinte e as chu­vas são escas­sas, mes­mo assim chove cer­ca de 200 bil­hões de met­ros cúbi­cos em pouco tem­po, vem a fal­ta d’água e a fome. Então, para solu­cionar essa fal­ta d’água no semi­ári­do, onde moram ess­es ser­tane­jos, a solução é se faz­er Peque­nas Bar­ra­gens de Super­fí­cie e Sub­ter­rânea, para se reter o maior vol­ume de água pos­sív­el e grande parte dessa água infil­trar no sub­so­lo, fazen­do um grande reser­vatório sub­ter­râ­neo. Den­tro dos bojos dessas bar­ra­gens se con­stru­ir Poços Ama­zonas e daí se bombear água para as cis­ter­nas já exis­tentes.  Abri­mos aqui um parên­tese, as cis­ter­nas exis­tentes se de con­cre­to, se con­struí­das com a pop­u­lação local, prop­i­ciou sem som­bras de dúvi­das, durante a sua con­strução, uma fonte de ren­da para o ser­tane­jo, mas as de PEAD-Poli­etileno Esten­di­do de Alta Den­si­dade, prop­i­ciou ren­da aos nego­ci­adores de Brasília, mas é uma cis­ter­na, e cadê a água, só quan­do chover ou de car­ro-pipa, pergunto.

Com uma Bar­ragem de Super­fí­cie do tipo Gal­gáv­el e Sub­ter­rânea, mais Poços Ama­zonas den­tro dos seus bojos, mais bombea­men­tos, o ser­tane­jo terá água não ape­nas para o seu con­sumo e de seus ani­mais, mas poderá inclu­sive faz­er peque­nas irri­gações de fruteiras via gote­ja­men­to, e ain­da, plan­tar nas vazantes durante o ano todo, e mais, toda a família do ser­tane­jo poder tomar ban­ho pelo menos uma vez por dia ao invés de lavar só os pés.

Essa solução seria para onde as bar­ra­gens já exis­tentes não alcançam, bar­ra­gens exis­tentes essas, que se interli­gadas podem aten­der grande parte do semi­ári­do sem a neces­si­dade das águas da Trans­posição, e sem a neces­si­dade de desapro­pri­ar ninguém, man­ten­do o homem do cam­po no cam­po, a propósi­to, os Pro­je­tos Públi­cos de Irri­gação são muito bons para a econo­mia da região, mas foram desvir­tu­a­dos em uma de suas pre­mis­sas, que era desen­volver o homem do cam­po, estes foram desapro­pri­a­dos das suas ter­ras, que foram entregues para outros.

Uma out­ra coisa que deve ser estu­da­da e explo­ra­da no semi­ári­do são as plan­tas nati­vas, por exem­p­lo, a faveleira é uma plan­ta nati­va que anual­mente flo­resce e dá fru­tos, que tem uma semente, que se proces­sa­da pro­duz um azeite comestív­el, acho que mel­hor que o azeite de oli­va, com o bagaço da pro­dução desse azeite, pode-se mis­tu­rar com as fol­has da faveleira e se pro­duzir uma tor­ta mel­hor do que a de caroço de algo­dão para ali­men­tar os ani­mais, do leite das cabras leit­eiras se pro­duzir um quei­jo de altís­si­ma qual­i­dade, com a flo­ração se pro­duzir mel, enfim, é uma série de per­iféri­cos saí­dos de uma plan­ta nati­va que não é explo­ra­da, isto é, os nativos, eu mes­mo fiz muito isso, pis­ar a semente da faveleira com far­in­ha e açú­car e com­er, é um pisa­do muito saboroso, logo não há tox­i­dade, senão eu teria mor­ri­do quan­do na infân­cia, pois comi muito pisado.

A EMBRAPA, as Uni­ver­si­dades Fed­erais de Camp­ina Grande-Pb e Sal­vador-Ba já tem estu­dos sobre essa mag­ní­fi­ca plan­ta nati­va do Semi­ári­do Brasileiro, e é bom que se frise, essa plan­ta só existe aqui no Nordeste.

Para se aten­der essas deman­das do Ser­tane­jo do Semi­ári­do, exis­tem os órgãos gov­er­na­men­tais CODEVASF-Com­pan­hia de Desen­volvi­men­to dos Vales do São Fran­cis­co e do Par­naí­ba, EMBRAPA – Empre­sa Brasileira de Pesquisas Agropecuária, os IPA’s Estad­u­ais e Sec­re­tarias de Agri­cul­tura, mas fal­ta uma coisa, é pre­ciso primeiro Recur­sos Orça­men­tários des­ti­na­dos a essas deman­das, é pre­ciso que ess­es órgãos des­tinem essas deman­das a téc­ni­cos que vis­tam a camisa, téc­ni­cos que saiam dos seus gabi­netes, téc­ni­cos que não ten­ham medo de sol e chu­va, téc­ni­cos que arregacem as man­gas de suas camisas, que se embren­hem na Caatin­ga a procu­ra dos mel­hores locais para implantarem as bar­ra­gens necessárias e pro­duzam a água para o povo.

Essas soluções estão aqui mes­mo, logo, só os téc­ni­cos locais são capazes de imple­men­ta-las, não adi­anta as soluções téc­ni­cas virem de Brasília, dos Gabi­netes fecha­dos, onde na maio­r­ia das vezes só ocor­rem nego­ci­atas do tipo, o Gov­er­no vai incen­ti­var a ener­gia eóli­ca com sub­sí­dios, daí já um políti­co é o primeiro a entrar no negó­cio para pegar o sub­sí­dio e a ger­ação de ener­gia que se explo­da, se vai sair mais cara ou não, infe­liz­mente é assim que ocorre. Exis­tem muitas out­ras plan­tas nati­vas que só exis­tem no Semi­ári­do e que não são exploradas.

  • Já par­tic­i­pamos de reunião em Brasília, para análise sobre o anda­men­to da elab­o­ração do canal do Sertão Per­nam­bu­cano, cuja vazão pre­vista era para aten­der cer­tas áreas irrigáveis, des­ti­nadas a grandes Empre­sas. Como essas áreas são dis­tantes umas das out­ras, per­gun­ta­mos se não esta­va pre­vista uma cer­ta quan­ti­dade de água, para as pro­priedades por onde o canal iria pas­sar e que não eram con­sid­er­adas poten­cial­mente irrigáveis.

A respos­ta dos pro­jetis­tas e dos cole­gas brasiliens­es da CODEVASF, era de que não have­ria água para essas pro­priedades, a água só seria sufi­ciente para as áreas irrigáveis e que seri­am des­ti­nadas aos empresários. Ime­di­ata­mente, retru­camos, sen­hores, o canal é para desen­volver a região, o homem da região, faz­er do homem da região uma pes­soa próspera, mudar a sua condição de vida. A respos­ta foi de que o homem da região não tin­ha condições e nem vocação para a agri­cul­tura irri­ga­da. Nova­mente retru­camos, mas nos­sa mis­são é exata­mente trans­for­mar a região, é trans­for­mar esse homem nati­vo em uma pes­soa próspera, em assim proce­den­do vamos estar alcançan­do o obje­ti­vo da Com­pan­hia de Desen­volvi­men­to dos Vales do São Fran­cis­co e Parnaíba.

O Pro­je­to do Canal do Sertão Per­nam­bu­cano está em Stand By, se exe­cu­ta­do vai ser de grande importân­cia para o desen­volvi­men­to de no mín­i­mo 17 (dezes­sete) Municí­pios na Bahia e Per­nam­bu­co, mas fica aqui nos­so pen­sa­men­to, o desen­volvi­men­to de uma região, está intrin­se­ca­mente lig­a­do ao desen­volvi­men­to do homem da região. Então, são decisões tomadas em Brasília sem ouvirem os téc­ni­cos da região, eu não enten­do como é que se vai pas­sar com um canal pelas ter­ras de sua pro­priedade e você não poder uti­lizar essa água.

  • Par­tic­i­pamos de uma out­ra reunião, em 2004, na CODEVASF-3ª SR, na qual um Con­sul­tor que veio a tira­co­lo com uns nos­sos cole­gas de Brasília, ensi­nar como se cri­ar BODE nas áreas de Sequeiro do Pro­je­to Pon­tal. Vale diz­er que o con­sul­tor esta­va fan­tasi­a­do com um cabe­lo grande, feito rabo de cav­a­lo, bar­ba, bigode, ócu­los fun­do de gar­rafa, um micro­com­puta­dor a tira­co­lo, um ver­dadeiro xiita vin­do de São Paulo ensi­nar o Nordes­ti­no a cri­ar BODE, é uma aber­ração vin­da de Brasília sem se con­sul­tar os téc­ni­cos da região. Ensi­nar o Nordes­ti­no a cri­ar bode.

OTAVIO ALVES DE CARVALHO – Engº Civ­il Aposen­ta­do – CODEVASF-3ª SR

-Con­hece­dor da real­i­dade do matu­to, do ser­tane­jo do Semiárido

-Coor­de­nação da Implan­tação de três Pro­je­tos de Irri­gação, des­de a aquisição das ter­ras à       entre­ga dos lotes

-Implan­tação de 12.000 km de Ener­gia Elétri­ca Rural

-Implan­tação de vários Poços Ama­zonas e Tubulares

-Implan­tação de Bar­ra­gens de Pequeno e Médio Porte

-Elab­o­ração de Doc­u­men­tação para fins de Licitação

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